Wednesday, November 4, 2015

TRÊS ABOLICIONISTAS ESQUECIDOS


Em 1938 Ivan Monteiro de Barros Lins Escreveu e em 
2015 Paulo Augusto Lacaz Comentou, Esclareceu e Complementou Atualizando.

                                   TRÊS ABOLICIONISTAS ESQUECIDOS
QUE LIBERTARAM MILHÕES DE ESCRAVOS
                               

‘Creio que a Ordem material deva ser mantida, mormente no interesse das mulheres, que são a melhor parte de todas as Pátrias, e das crianças, que são a Pátria do futuro:

“Creio que no estado de inquietação do Mundo Moderno só há um meio de manter a ordem material: garantir a mais ampla, absoluta e definitiva liberdade espiritual* - com liberdade de expressão com responsabilidade Moral e Social; (*) Escolha de religião

“Creio cegamente no postulado de Fritz Müller: O pensamento deve ser livre como a respiração”.

Essas, minhas Senhoras e meus Senhores, a profissão de fé desassombrada, leal e franca do autor de “Rondônia”, e também - pasmai! - desses tais que frequentemente vos são pintados de modo tão desfavorável: aos positivistas!

TRÊS ABOLICIONISTAS ESQUECIDOS

Nesta hora de revivescência e glorificação de todos quantos, empolgados por um dos mais puros ideais, pelos quais até hoje vibrou a alma nacional, cooperaram na libertação da raça negra no Brasil, seja-me lícito relembrar três grandes vultos injustamente esquecidos, os quais, todavia, formaram, sem desdouro, nos árduos dias de luta, ao lado dos mais estrênuos e desnoitados paladinos da nobre causa.

São eles: Benjamin Constant, Miguel Lemos e Teixeira Mendes.

Referindo-se a este último, disse o Ministro Edmundo Lins, em sessão cívica, realizada, em 1927, no Instituto Nacional de Música:

“Do último quartel do século passado até o dia de sua morte, não houve grande problema - social, político ou moral - que éle não discutisse e não pusesse em evidência, já na imprensa, já nas prédicas, que, aos domingos, durante longos anos, fez no Templo da Humanidade.

“Mas a prédica de todos os dias e de todas as horas era a sua vida puríssima, toda de fé de abnegação, toda de humildade, toda de amor.

“Eis porque, neste século materialista, em que todos, qual mais, só querem dinheiro, sô procuram prazeres, à evocação do nome de Teixeira Mendes, todas as cabeças devem curva-se e todos os corações deviam elevar-se para as alturas”.

Entretanto, por não ser católico e nem apenas livre-pensador, é Teixeira Mendes, com seus companheiros de ideias, sistematicamente esquecido em todos os fatos  nacionais de que participou, muitas vezes com invulgar relevo, enquanto outros, de mui menor valia, são ruidosamente celebrados.

É mesmo chocante a maneira pela qual, na Festa da Bandeira, (festa instituída, entre nos, por positivistas, diga-se de passagem), se referem os jornais, longamente, aos autores do Hino (poesia e musica), deixando de fazer sequer fugaz menção ao simples nome do autor desse símbolo, por cuja beleza se declaram tão deslumbrados.

Foi reagindo contra essa inqualificável campanha do silêncio em torno da atuação abolicionista, benéfica e eficiente, como as que mais o foram, de Benjamin Constant, Miguel Lemos e Teixeira Mendes, que tomei a iniciativa desta palestra.

BENJAMIN CONSTANT

Foi, um abolicionista ardoroso, não só de palavras, mas ainda, principalmente, de ação.

Em 1849, falecia o pai de Benjamin Constant, deixando, na mais extrema pobreza, a viúva e cinco filhos, cujo mais velho Benjamin  apenas em vésperas de completar treze anos.

Já pela dor da viúves, já pela negra miséria de que via ameaçados os filhos, foi a mãe de Benjamin Constant acometida de uma crise cerebral, e ele, fora de si, atirou-se ao Paraíba, perto da cidade de Paraíba do Sul, sendo salvo graças à intrépida dedicação de uma escrava da fazenda de que era seu pai o administrador.

Data, de certo, dai, o caloroso abolicionismo de que deu provas a vida inteira.

Assim, conta  seu primeiro biógrafo, o Dr. Macedo Soares:

“Sei que, trazendo sua Senhora alguns escravos em dote ou por herança, ele declarou logo que, na parte que lhe tocava, eles estavam livres e sempre evitou a ocasião de utilizar o serviço deles’. (1)

Alem da propaganda, decorrente de sua ação na Escola Militar e na Escola Normal, formou Benjamin Constant, em 1883, com André Rebouças, Paulo de Frontin; Alvaro de Oliveira e outros professores, no Centro Abolicionista da Escola Politécnica, o qual promoveu a libertação do Largo de São Francisco de Paula, enquanto a Confederação Abolicionista se encarregava de limpar, como dizia, da escravidão, outros largos e ruas centrais da cidade.

Falecendo, em 1886, José Bonifácio, o Moço, neto do Patriarca, o qual terminara a vida advogando a redenção dos cativos, suspendeu Benjamin Constant a aula de astronomia, que devia dar na Escola Normal, lançando, na respectiva caderneta, a seguinte nota:

‘Deixei de dar aula em sinal de profundíssimo pesar pela morte do venerando conselheiro José Bonifácio. O dia da morte de um homem que, como este, se impôs ao respeito e á estima dos seus concidadãos por seus importantes serviços e elevadíssimos dotes morais, mais ainda do que por seu invejável talento e vasta ilustração, é um dia de verdadeiro luto nacional.

Retificando uma noticia que, a esse respeito, deu o  órgão abolicionista, “Gazeta da Tarde”, ai estampou Benjamin uma carta, a qual conclui dizendo:

“Não há, a meu ver, cruzada mais nobre, que mais desperte interesse à causa da humanidade, e, portanto, a todos os homens de espirito ( inteligência) e de coração ( sentimento) , que essa em que se procura arrancar aos cativeiros arbitrários e degradante, mais, de um milhão de infelizes sem lar, sem Pátria e sem Família, em um século em que o movimento geral humano se traduz felizmente,  de modo cada vez mais enérgico e bem acentuado, no sentido da progressiva elevação moral de nossa espécie. [Como sonhava grande o patrono da república]

“Não podia, pois, ser indiferente a essa cruzada aquele homem puro, aquele invejável talento privilegiado, aquele coração magnânimo, sempre aberto ao largo e profundo amor da Humanidade.

“Mas os grandes homens não morrem: Perpetuam-se na memória dos nossos semilhantes e nos grandes feitos com que se enobrecem na vida: o dia da morte é, para eles, a aurora do grande dia da eternidade”.

E, em Outubro de 1887, em famosa reunião do Clube Militar, do qual era Vice-presidente, propôs tomasse este, por divisa, a abolição, o que foi aceito, dando origem à petição dirigida por Deodoro, em nome do referido Clube, à Princesa Isabel, afim de não empregar mais o exercito na captura dos que se subtraiam ao cativeiro.

O então Ajudante-General do Exército, Marques da Gávea, devolveu a petição; mas, largamente divulgada pela imprensa, produziu os efeitos almejados.

A partir desse dia, estava, de fato, realizada a abolição, porquanto ficavam os fugitivos certos da impunidade, visto negar-se o exército a colaborar na captura deles. (2)

Foi o que salientou, excelentemente, o provecto Cristiano Ottoni:

“Quando um Delegado de polícia dizia aos soldados: “amarrem aqueles negros, que não querem trabalhar”, respondiam: “isso não, que não é missão de soldados, mas de capitães do mato”.

Só governa quem dispõe de fôrça, e a monarquia que, apesar do hoje em dia tão decantado abolicionismo do “Magnânimo”, mantivera indefinidamente a escravidão, não tendo mais fôrça para continuar a sustentá-la, a emancipação se fez, “e do modo pelo qual se fez”dizia João Alfredo, o autor da “Lei Áurea” “porque a nação o quis e assim o quis”.

Como se vê, a moção de Benjamin Constant foi o golpe de misericórdia contra a nefanda instituição, ficando os mais entusiastas propagandistas atordoados com a maneira precipitada pela qual se elaborou a Lei Áurea, sendo, entre os políticos, corrente a opinião de mais facilmente se eliminar a monarquia do que o cativeiro.

Depois do 13 de Maio, confessou, publicamente, Joaquim Nabuco, respondendo a um escrito de Teixeira Mendes, estar, ainda em Fevereiro de 1888, longe de supor — segundo suas próprias palavras — “que a escravidão linha os seus dias contados em nosso país”.

Assistindo-lhe à queda em sete dias, cuidaram todos — observa -Teixeira Mandes -  presenciar um milagre.

Dai se concluí também não haver a fraqueza da monarquia decorrido da abolição mas, ao revés, esta é que proveu daquela.

Seja, porém, como for, não admite duvida ter sido uma das etapas mais decisivas do 13 de Maio a proposta de Benjamin Constant para que o Clube Militar adotasse, por divisa, como efetivamente, adotou, a abolição.

Deixando em silêncio muitas outras de suas entusiásticas manifestações abolicionistas, cito ainda as seguintes.

Esteve Benjamin, conforme o registou em seu “Diário”, presente à sessão da Câmara dos  Deputados de 8 de Maio de 1888, em que foi lido e aprovado o projeto de abolição. E, promulgada a Lei Áurea, foi, no dia seguinte, á testa dos Meninos Cegos. de que era Diretor, e em companhia dos professores, congratular-se com João Alfredo, Presidente do Conselho, e, depois, com José do Patrocínio, na redação da Cidade do Rio”, por ele fundada e dirigida. (3)

A Coelho Netto, que o assistiu, devemos a comovente narrativa desse episódio:

‘Está aí Benjamin Constant com os cegos, disseram a Patrocínio. Ao ouvir tal nome Patrocínio pôs-se logo de pé e rompendo o grupo da sua guarda, saiu à sala para receber o grande soldado e indefesso patriota, que, então, dirigia o instituto dos Cegos. Lá estava ele o varão austero, cercado de seus alunos. Patrocínio adiantou-se comovido e estendeu-lhe a mão. Benjamin, atraiu-o a si sem uma palavra e os dois homens conservaram-se um momento abraçados, enquanto a banda de música dos cegos executava o Hino Nacional. Terminada a peça patriótica, Benjamin pronunciou um pequeno discurso em nome daqueles que ali estavam — os cegos — que lhe haviam pedido a graça de os guiar à presença do homem generoso, que, a golpes de genialidade, realizara o milagre de expungir da Pátria a mancha da escravidão. Não podiam vê-lo; que ao menos lhes fosse dado ouvirem-no. Guardariam na alma o som da palavra poderosa, que abalara e fizera ruir a muralha do cárcere infame, onde gemia cativa e vilipendiada toda uma raça.

Os cegos, que se haviam ajuntado em volta de Benjamin sorriam enlevados, murmurando aplausos enternecidos. Patrocínio adiantou-se para responder. Cercamo-lo. O formidável tribuno, de inspiração sempre torrencial, e orador estupendo, cuja eloquência não tivera, jamais, competidora, o homem ímpeto, o gênio explosivo quedou encerrado naquele auditório de trevas.

“Os olhos dos cegos moviam-se desvairadamente nas órbitas; sentia-se neles a ânsia aflitiva dos prisioneiros, que se debatem por traz das grades dos seus presídios. Alguns abriam desmedidamente, os olhos opacos outros fechavam-nos: outros batiam as pálpebras. E Patrocínio olhava-os a todos sem poder tirar de si uma palavra. Tremia. Fora, a multidão bradava por éle. Adiantou-se, tomou um fôlego profundo e quando pensamos que éle fosse iniciar o discurso que, certamente, seria maravilhoso, vimo-lo atirar-se de encontro a Benjamin Constant, inclinar-lhe a cabeça ao ombro, rompendo em soluços.

“E o grande soldado, inflexível como uma coluna, amparou-o nos braços, apertando-o ao perto e, através das lentes do seu pince-nês, vimos-lhe os olhos arrasarem-se-lhe de lágrimas. E em volta dos dois homens, os cegos, de olhos mortos, ignorando a cena que ali se passava, sorriam, antegozando o encanto da palavra, que fora substituída por eloquência mais comovedora - a das lágrimas”.

Nada mais belo do que esse episódio da Abolição, no qual dois, grandes homens, separados por tantas idéias e sentimentos, misturavam lágrimas de júbilo pela consecução de um ideal comum.

Em princípios de Junho de 1888, saudando o Ministro Argentino, que visitava a Escola Militar, expandiu o futuro Fundador da República a alegria de que se sentia possuindo, em comovente discurso, de que estrai  o seguinte tópico:

“A formosa constelação do Cruzeiro, que, no dizer do eminente estadista, General Mitre, marca as horas da noite no céu da América do Sul, desafrontada, agora, da sinistra mancha negra que lhe toldava o belo esplendor, brilhará, resplendente, de límpida e fulgente luz, no céu moral da livre América do Sul, como o santelmo da bonança, marcando, não mais as horas da noite, mas, serena e eternamente, as horas do grande dia de paz e prosperidade para todos os povos sul-americanos, dia que nessa data surgiu, radiante, nos horizontes do nosso formoso e vastíssimo continente....’

Glória, pois, minhas Senhoras e meus Senhores, glória ao grande e benemérito repúblico, que, não só vibrou como acabamos de ver, pelo ideal abolicionista, mas ainda colocou, ao serviço dele, o imenso prestígio moral e intelectual, que desfrutava no seio das classes armadas, tornando-o, ao lado de Caxias, Osório e Deodoro, uma das mais nobres figuras de que se possa vangloriar o exército brasileiro.

MIGUEL LEMOS

Empolgado por um movimento intelectual, que abarca a totalidade dos problemas humanos; propagando os ensinos de Augusto Comte, e, portanto, preocupado com a reorganização integral da sociedade, térndo, como dogma, a ciência, é; com regime, a indústria, não podia o Fundador da Igreja e Apostolado Positivista do Brasil deitar de ser abolicionista convicto e entusiasta.

Achamos em uma de suas cartas ao Dr. Joaquim Ribeiro de Mendonça, escrita em Março de 1883:
“E, já que falamos de escravos, para que o amigo não me acuse, como se costuma, de mero platonismo nesta questão, vou contar-lhe que, na ocasião de casar-me, alforriei os três únicos escravos que possuía minha sogra, empregando para isso uns dois contos e quinhentos mil réis que tinha minha mulher, e que eu nem ela podíamos utilizar em nosso proveito, segundo o que manda a nossa doutrina ortodoxa  de não dever a mulher possuir capital nenhum, nem o marido receber dela nenhuma espécie de bens. (P.A. Lacaz não é ortodoxo - vide um testo da Constituição Societocrática Republicana escrita em 1996 por P. A. Lacaz )  http://sccbesme-humanidade.blogspot.com.br/2012/07/responsabilidade-das-religioes.html - Queiram ou não as Mulheres são diferentes dos homens; e vice versa; e são pelas diferenças que ocorrem as uniões. Alguns Direitos e Deveres são iguais, mas graças a DEUS, a grande maioria dos Direitos e Deveres é diferente. Igualdade somente de oportunidades.

7.2.1 – AS MULHERES QUE POR VENTURA, DEVIDO A SUA ÍNDOLE OU POR NECESSIDADE, DEVIDO À INSUFICIÊNCIA DO TRABALHO MASCULINO, NO SEIO DA FAMÍLIA, QUEIRAM SE DEDICAR AO TRABALHO FORA DO LAR, QUE O FAÇAM SE ASSIM DESEJAREM, DE COMUM ACORDO COM O CÔNJUGE; DESDE QUE NÃO PREJUDIQUE A EDUCAÇÃO MORAL DOS SEUS FILHOS, ATÉ A IDADE DE 14 ANOS. ( TÍTULO I - DO PRINCÍPIO FUNDAMENTAL – CONSTITUIÇÃO SOCIETOCRÁTICA REPUBLICANA-P.A.LACAZ )HTTP://ENTRETENIMENTO.R7.COM/BLOGS/BLOG-DA-DB/TAG/BABY-GEORGE/

 Um programa educativo e pedagógico não pode ser estabelecido sem que o educador tenha adquirido o conhecimento científico da natureza física, intelectual e moral do Ser Humano.

“Peço-lhe desculpa desta informação pessoal, mas achei-a necessária para prevenir, desde já o que se costuma dizer contra os que falam e não fazem”.

E, ao redigir a Base Moral do Centro Positivista, por ele fundado, estabeleceu Miguel Lemos:

Base Moral

“Todos os membros do Centro Positivista e das sociedades filiais aceitam, sem restrição alguma, o conjunto dos deveres positivos, prescritos pela sua religião ( Doutrina). Tomam todos o compromisso solene de conduzir-se de acordo com suas opiniões e de consagrar toda sua atividade  e todo o seu devotamento à incorporação do proletariado na sociedade moderna, resmo atual de toda a ação positivista.

“De um modo mais especial, comprometendo-se:

1º a não possuir escravos, qualquer que seja a forma desta posse monstruosa.

Mas, não foi só.
Em inúmeras prédicas, cursos, artigos e opúsculos, bateu-se Miguel Lemos pela abolição.

Assim, publicou, em 1884, valiosa monografia: “O Positivismo E A Escravidão Moderna”

— trechos extraídos das obras de Augusto Comte, seguidos de documentos positivistas, relativos à questão da escravatura no Brasil, precedidos de uma introdução.

Na advertência desse trabalho dedicado à memória de Toussaint Louverture, “o primeiro dos pretos, "Pronunciador" de Haiti, promotor e mártir da liberdade de sua raça”; e, bem assim, a província do Ceará; “O primeiro torrão brasileiro a purificar-se do crime ocidental”, diz Miguel Lemos:

“As tergiversações não são mais admissíveis e o governo que, em vez de pôr-se á testa do movimento para dirigi-lo, nada fizer ou procurar opor-lhe obstáculos, será levado pela onda e submergido. Ë tempo de ter coragem e assumir a posição que compete aos que pretendem ser pastores dos povos, na frase de Homero.

“Por outro lado, cumpre libertar, quanto antes, o país de sua exclusiva preocupação sobre esta absorvente questão, afim de que possa voltar sua solicitude para a série de reformas imprescindíveis de que carecemos, e para as quais a abolição é apenas um preambulo necessário”.

E, na introdução, assim se exprime:

“Julgamos de grande utilidade para a causa da abolição, que hoje apaixona todos os corações brasileiros, dar maior circulação: entre nós, aos preciosos e profundos trechos em que o Mestre da filosofia científica e Fundador da religião definitiva, julgou e condenou, sem apelo, o monstruoso crime, que, ainda hoje, conspurca a pátria brasileira. Estamos certos de que estes extratos confirmarão mais os abolicionistas em suas justas aspirações, e desvanecerão, de urna vez por todas, quantos sofismas têm procurado fazer vencer os obcecados e interessados defensores da infame instituição.

“Não é esta a primeira vindicação que a Religião da Humanidade inspira a corações brasileiros, em favor dos infelizes escravos de nossa terra”.

E, depois de referir-se às aspirações abolicionistas de Dona Nísia Floresta Brasileira Augusta, a qual se deu, pessoalmente, com Augusto Comte, deixando-se, até certo ponto, influenciar pelas doutrinas dele passa Miguel Lemos a analisar a obra do positivista, Dr. Brandão Júnior, aparecida em Bruxelas, em 1865, com o titulo: ‘A Escravatura no Brasil, precedida de um artigo sobre a agricultura e colonização no Maranhão’.

E, ao terminar essa análise. continua:

A questão do elemento servil entrou naturalmente dentro da esfera obrigada de nossa ação. E assim que constantemente tem ela ocupado um lugar condigno em nossas  conferências, em nossos, cursos, nas publicações que temos feito, havendo empregado todos os esforços ao nosso alcance, públicos e particulares, para que se realize o mais breve possível a grande aspiração nacional.

“Seja-nos lícito recordar, também, que tivemos a honra de haver tirado do completo esquecimento, em que jazia (4), o monumental opusculo do nosso grande José Bonifácio, em que este preclaro e principal organizador de nossa independência discutiu, com admirável capacidade, o problema escravo e procurou dar-lhe uma solução que, sem dúvida, foi a melhor elaborada nessa época (1823). E nossa intenção, assim que as circunstâncias do nosso fundo tipográfico o  permitirem, reeditar o trabalho do nosso maior estadista como uma homenagem a seu gênio e serviços e como uma prova do papel preeminente que lhe coube na obra de nossa emancipação política.

‘Finalmente por ocasião do último projeto aprestado às câmaras pelo atual ministério, e cuja discussão nem sequer foi iniciada, manifestamo-nos de novo sobre este assunto por um protesto motivado, publicado no “Jornal do Comércio” de 7 de Agosto de 1883, depois reimpresso, no Recife, em folheto.

“De novo vindo agora concorrer com mais um esfôrço popularizando os trechos principais em que o maior pensador do seculo sentenciou a escravidão moderna, e que constituíram e hão de continuar a ser o fundamento sistemático de nossas intervenções nos debates levantados por esta momentosa questão.

“Não é tudo, porém - O Positivismo não e mero diletantismo, cujos adeptos não se reconheçam dever algum. O Positivismo é uma religião, o que quer dizer que coordena os sentimentos e atos de acordo com as opiniões, que prega e demonstra. Não bastam simples palavras, que nada sustam aos declamadores: nesta, como nas demais questões, esforçamo-nos por ajuntar o exemplo à doutrina.

“E por isto que nenhum membro do Centro Positivista Brasileiro pode possuir escravos nem por compra, herança, donativo, ou empréstimo. E, para a fiel execução, deste preceito, não tem seu diretor recuado diante da necessidade de eliminar do grêmio elementos divergentes e equívocos, nem alguns confrades têm hesitado em purificar-se, direta ou indiretamente, do crime cuja expiação cabe a todos os ocidentais.

‘E assim que, por pensamentos, sentimentos e atos os positivistas brasileiros, ou, pelo menos, os que se esforçam par se tornar dignos deste nome, têm cumprido o seu devier quanto á questão, que nos ocupa, e procurado concorrer para que nao esteja longe o dia, em que só homens livres calquem o solo sagrado de nossa pátria”.

Em nota, aprecia - Miguel Lemos a memória de José Bonifácio de Andrada e Silva sobre a escravatura, apreciação que prazeirosamente reproduzo aqui, pela oportunidade da mesma neste ano em que. ao lado do primeiro cinquentenário da Lei Áurea, também comemora o Brasil o lº. Centenário da morte do Patriarca de sua Independência:

‘Esta memória — escreve Miguel Lemos conquanto publicada em 1825, já estava redigida quando a Constituinte foi dissolvida a 12 de Novembro de 1823. José Bonifácio já anteriormente havia apresentado à mesma Assembléia um trabalho análogo em relação aos nossos selvagens ( Selvícolas), sob o título de “Apontamentos para a civilização dos índios bravos do Império do Brasil”, mandados estampar na Imprensa Nacional nasse ano de 1823. Estes dois trabalhos, juntamente com os outros aspectos de sua ação política, demonstram, com a maior evidencia, que na cabeça de José Bonifácio existia um plano completo de assentado para a organização da nova nacionalidade, sem exclusão de nenhum dos elementos constitutivos do magno problema.

          E, por último, direi que nas instrutores que o governo de São Paulo deu aos seus deputados às côrtes de Lisboa, a 9 de Outubro de 1821, instruções redigidas por José Bonifácio e que constituem um documento histórico da maior valia ainda não aproveitado, lê-se, no art. 6º o seguinte:

          “Que se cuide em legislar e dar as providências mais sábias e enérgicas sobre dois aspectos da maior importância para a prosperidade e conservação do Reino do Brasil: o lº sobre a catequização e civilização geral e progressiva de Índios bravos que vagueiam e pelas matas e brenhas; sobre cujo objeto um dos membros deste Governo dirige uma pequena memória às Côrtes Gerais por mão de seus deputados; o 2º requer imperiosamente  iguais cuidados da Legislativa sobre melhorar a  sorte dos escravos favorecendo a sua emancipação gradual e conversão de homens imorais e brutos em cidadãos ativos e virtuosos, vigiando sobre os senhores dos mesmos escravos para que estes os tratem como homens cristãos e não como animais, como se ordenara nas Cartas  Regias de 23 de Março de 1688 e de Fevereiro de 1798, mais tudo isto com tal circunspecção que os miseráveis escravos não reclamem estes direitos com tumultos e insurreições, que podem trazer cenas de sangue e de horrores. Sobre este assunto o mesmo membro deste Governo oferece alguns apontamentos e idéias ao Soberano Congresso”.

“O membro do governo provisório de São Pauto a que se alude aqui - nota Miguel Lemos - é o próprio José Bonifácio.

‘Tudo isto demonstra — concluí o discípulo de Comte - que, à preeminência política e intelectual na discussão destes problemas, cumpre ajuntar, em favor de José Bonifácio, a precedência cronológica. Quando se atende a todas estas provas de alta capacidade do grande ministro da Independência, todo coração patriota, livre de prevenções, lamentara eternamente que as intrigas de ambiciosos medíocres, espicaçados pela inveja e alentados pelo bafejo prostituído de uma concubina, tivessem obrigado o venerando sábio a deixar o governo a 17 de Julho de 1823. Quantos problemas teriam sido resolvidos por José Bonifácio e estão ainda hoje à espera de uma solução! Bastará dizer que si o eminente paulista tivesse tido o tempo necessário para realizar os seus vastos desígnios políticos, há muito estaria a nossa pátria lavada da mancha da escravidão’.

E, efetivamente, pelo projeto elaborado, um 1823, por José Bonifácio, seria o tráfico extinto dentro de um lustro e gradualmente abolido a escravidão dentro de anos 33 anos, isto é, em 1856.

Transcrevamos, agora, trechos do magnífico artigo que, a 7 de Agosto de 1883, publicou Miguel Lemos, no “Jornal do Comércio”, sob o titulo:

“A Incorporação do Proletariado Escravo e o Recente Projeto do Governo.”.

“José Bonifácio escreveu:

“A sociedade civil tem por base primeira a justiça, e por fim principal a felicidade dos homens; mas que justiça tem um homem para roubar a liberdade a outro homem, e, o que pior é, dos filhos dêste homem e dos filhos destes filhos? Mas dirão talvez que favorecer à liberdade dos escravos será atacar a propriedade. Não vos iludais, Senhores, a propriedade foi sancionada para bem de todos, e qual é o bem que tira o escravo de perder todos os seus direitos naturais, e tornar-se de pessoa a coisa na frase dos jurisconsultos? Não é, pois, o direito da propriedade que querem defender e o direito da fôrça, pois que o homem não podendo ser coisa, não pode ser objeto da propriedade Si a lei deve defender a propriedade, muito mais deve defender a liberdade pessoal do homem, que não pode ser propriedade de ninguém sem atacar os direitos da Providência, que fez os homens livres e não escravos; sem atacar a ordem moral das sociedades, que é a execução estrita de todos os deveres prescritos peta natureza, pela religião e pela sã politica: ora a exsução de todas estas obrigações é o que constituem a virtude; e toda legislação, e todo governa (qualquer se seja a sua forma) que não a tiver por base, é como a estátua de Nabucodonosor, que uma pedra desprendida da montanha a der­rubou pelos pés; é um edifício fundado em areia solta, que a mais pequena borrasca abate e desmorona”.

“Vê-se, assim, que o estadista de nossa Independência, discutindo o problema da escravidão no Brasil, já proclamava, com admirável firmeza, os princípios que mais tarde haviam de receber, com a fundação da Sociologia por Augusto Comte, a sua demonstração científica; isto é, que a propriedade tem uma razão de ser social e só pode estender-se ao capital material da Humanidade, composto de instrumentos e provisões, com exclusão dos agentes do trabalho.

“Foi isso escrito em uma representação que devia ser oferecida à Assembleia Geral Constituinte’ (1823) e não pode ser levada a seu destino por ter sido essa Assembléia dissolvida pelo primeiro imperador a 12 de Novembro. Semelhante representação acha-se, porem, publicada desde 1825, isto é, há mais de meio século! Ela é acompanhada de um projeto de abolição que, a ter sido executado desde essa época, já hoje formaria o Brasil um pais de cidadãos, como o grande estadista ambicionava.

O cego interesse dos senhores de escravos impediu, então, e tem impedido ate o presente como impedirá no futuro, qualquer medida decisiva. O resultado desa má vontade, combinada com a insuficiência política, dos dois imperadores, têm sido as medidas sofisticas, destinadas antes a assegurar a prolongação da monstruosa posse, do que a lhe acelerar o desaparecimento.

“Tal é ainda o caráter do novo projeto apresenta-lo pelo ministério Lafayette.

“É tempo que os cidadãos verdadeiramente liberais deixem de iludir-se pelas formas do constitucionalismo.

“O regime parlamentar só serve para garantir a liberdade das mediocridades intrigantes, na frase de Augusto Comte, e sofismar todas as necessidades sociais, deixando sem responsabilidade efetiva a direção do Estado, O chefe pode assim lançar a responsabilidade sobre as câmaras, e as câmaras sobre o chefe, sofrendo o país, cujos interesses não podem ser representados pelo eleitorado, mesmo supondo o sufrágio universal, quanto mais com um eleitorado restrito pela capacidade pecuniária, como e o nosso caso” .

Depois de discutir, a fundo, o problema escravo perante a situação política do Brasil, apelava Miguel Lemos para o imperador afim de que, rompendo com o parlamentarismo, cujos vícios estigmatizava, decretasse, ditatorialmente, a abolição.

     Antecipando-se, de mais de meio século, aos escritores que hoje, pomposamente se arrogam, entre nós, o título de sociobiólogos, evidenciou ainda Miguel Lemos não provir o mal, do Brasil do negro, mas, tão só, da escravidão, a qual, segundo fizera ver Augusto Comte, degradava, ao mesmo tempo, os senhores e os cativos.

     E, referindo-se aos dotes morais da raça negra e à questão, já nessa época vivamente debatida, da indenização, assim se exprime:

     “O fato da escravidão, é a prova mais evidente da superioridade moral da raça africana, qual, por isso mesmo, Augusto Comte denomina raça afetiva. O africano é, naturalmente, venerador, e, por isso, submete-se.

     ‘Quanto às perturbações individuais dos Senhores, não merecem do chefe do Estado a solicitude que os escravocratas andam a reclamar. Não lhes assiste o mínimo direito a indenização pelo prejuízo resultante do fato de deixarem de ser opressores de mais de um milhão de nossos compatriotas, para se tornarem realmente trabalhadores. Porventura já se lembraram de reclamar indenização para os atuais escravizados pelo tempo que seus avos, seus pais e eles estiveram trabalhando sem auferir o mínimo resultado de tantos sofrimentos?

     ‘Pois bem: mais de um milhão de nossos compatriotas de origem africana não têm de ser indenizados; si, tacitamente, nós lhes pedimos perdão e esquecimento para o crime de nossos antepassados, que veem fazer esses milhares de pedintes que, com escândalo para o mundo e ignominia para o Brasil, reclamam para si uma indenização que seria o preço do crime?

     “Não, mil vezes não! Como indenização, nem o ar, que respiramos, podem reclamar. A compaixão nacional, levada ao extremo, pode julgar-se obrigada a doar os senhores com uma parte do capital social; mas é isto uma generosidade apenas, cujos limites o doador traçará com plena autoridade.

     ‘Tais as considerações que julgamos do nosso dever apresentar ao chefe do Estado e aos nossos concidadãos no momento atual. Elas se filiam, completando-o, a tudo quanto os positivistas brasileiros teen dito sobre esta questão, desde a memoria do nosso confrade, Sr. Brandão Junior, em 1865, e constituem um protesto contra o novo sofisma ministerial.

     “No Brasil, como no mundo, não deve haver escravos; tal a fatalidade à qual as condições morais do nosso século nos submetem com a mesma inflexibilidade, com que as condições cosmológicas nos impõem o movimento da Terra.

     Nos anos seguintes, além de realizar diversas conferências, publicou ainda Miguel Lemos vários preciosíssimos opúsculos abolicionistas, entre os quais ‘Á incorporação do proletariado escravo e as próximas eleições’; de que cito a conclusão:

     “Os positivistas brasileiros cumprem, portanto, um dever que não comporta sofismas, reclamando, em nome da pátria, que todos os cidadãos empreguem a sua influência, direta ou indireta, para concentrar os votos do eleitorado em candidatos abolicionistas, que mereçam a confiança do governo. Com efeito, são eles os que reúnem maior número de probabilidades de superar a tenebrosa unidade da liga escravocrata; e em política, como em qualquer outra arte, a sabedoria consiste no aproveitamento das forcas existentes.

     “Encontrando uma maioria disciplinada sentir-se-á o digno ministro (refere-se ao Senador Dantas) com ânimo para ir além de um projeto que, mesmo aos seus olhos, não pode refecer outro valor que, não, o de ter posto, o problema. E, então, apesar dos obstáculos do regime parlamentar, o ano de 1835 deverá assinalar o desaparecimento dos últimos vestígios da mais monstruosa das anomalias da transição ocidental; porque, o governo que, nessas condições, hesitasse em satisfazer os reclamos da Pátria e da Humanidade teria lavrado, para sempre, a sua condenação”.

     Nada mais justo, pois, minhas Senhoras e meus Senhores, do que relembrarmos e glorificarmos, neste momento de testa e regozijo, Miguel Lemos, esse batalhador de inúmeras causas nobres, entre as quais avulta, como vindes de ver, a abolição.

TEIXEIRA MENDES

     “Ele foi” — disse-o Afrânio Peixoto, em sessão da Academia Brasileira de Letras — “um desses raros que pode ser o orgulho da espécie”.

     Dotado de um caráter inamolgável; de uma inteligência forte e penetrante, só excedida pela generosidade de um coração, onde encontraram eco todas as dores de seu século; teve Teixeira Mendes a infância decisivamente influenciada pelo gênio poético de Gonçalves Dias, amigo intimo de sua família e inspirador do seu precoce e inflamado entusiasmo social em prol dos indígenas, brasileiros.

     Da “Canção dos Tamoios”, dos “Timbiras” e do “Y — Juca — Piranha”, por éle guardados de côr desde a mais tenra infância até o derradeiro dia de sua vida, nasceu o germe fecundo das intervenções de seu apostolado a favor dos nossos aborígenes.

     Na primeira juventude, queimavam-lhe na alma, como se fosse um ferro em brasa, os versos pungentes. do “Navio Negreiro”

     E  seu civismo agitou-se incontido, até ver inteiramente apagada, da bandeira pátria, a nódoa do ignominioso crime.

     Em 1880, já convertido. à Religião da Humanidade — essa religião toda de amor e sabedoria, verdadeiro sistema universal de educação, a que consagrou quase meio século de incessante labor — publicou Teixeira Mendes,’ na “Gazeta da Tarde”, os “Apontamentos para a solução do problema social no Brasil”, logo em seguida estampados em opúsculo.

     Aí, mostra que a abolição estava longe de constituir a solução do problema proletariado brasileiro, não passando de simples etapa desse mesmo problema, o qual só seria resolvido mediante o  que Augusto Comte chama “a incorporação do proletariado na sociedade moderna”.

     “A situação do trabalhador – escrevia, com efeito, em 1880, Teixeira Mandes — e a preocupação hodierna de todos os espíritos esclarecidos, e, mais que tudo, dos corações bem formados. Entre nós, a grande massa produtora conserva-se ainda na escravidão, e, no resto do Ocidente, acha-se apenas acampada segundo a frase profundamente característica de Augusto Comte. Certamente vai um abismo entre as duas condições; cumpre. Porém, lembra-lo afim de mostrar que a emancipação do escravo não resolve o problema social brasileiro. É imprescindível não esquecer jamais o caráter sintético das questões humanas, e chamar a atenção dos governados e governos para o verdadeiro ponto de vista: a reorganização da sociedade’.

     E, depois de patentear que a apreciação de um problema político exige: 

    lº, o conhecimento das leis sociais, como base das medidas a adotar em abstrato; 

  2º, o exame das condições de cada caso, afim de determinar as medidas legitimas, isto é, oportunas; e,

  3º, a resignação para não eliminar a consideração do tempo, imprescindível em todas as artes e muito mais em política, passa Teixeira Mendes a focalizar a questão social, resumindo as vistas de Augusto Cornte a ésse respeito na “Política Positiva” e as considerações de Pierre Laffitte no opúsculo Le Positivisme et L´Élconomie Politique”concluindo da seguinte forma:
http://www.doutrinadahumanidade.com/artigos/lequilibre_economique.htm  http://palacazgrandesartigos.blogspot.com.br/2014/01/economia-politica-sob-visao-positivista.html   ( Podemos  pinçar o que for possível para ser  aplicado com o passar dos tempos -Neste momento é só para ilustrar) 

 ‘Os princípios, que acabamos de indicar rapidamente, assinalam a marcha a seguir pelo estadista brasileiro na solução do nosso problema social. Em primeiro lugar, o homem não pode ser propriedade de ninguém: o produtor do capital humano de modo algum poderá confundir-se com o produto do seu trabalho, isto é, de sua ação real e útil sobre o mundo exterior. Cumpre portanto, afastar as considerações sofísticas do egoismo depravado, que erige as medidas a tomar em ataques a propriedade: semelhante propriedade não existe.

     “Como dissanos, o de que se trata é da incorporação do produtor à sociedade moderna. No Brasil, o produtor é escravo, importa, pois, libertá-lo previamente — tais os verdadeiros termos do problema. Pode haver divergências nas resoluções a adotar para atingir semelhante desiderato; em caso algum; porém, deverá prevalecer a consideração da ruína possível de um punhado de escravocratas.

     “A nação, que não hesitou em sacrificar milhares de seus filhos e comprometer  seu futuro em uma guerra de cinco anos, cobrindo o país de inválidos, viúvas e órfãos, porque o exigiu a honra nacional, não pode recuar perante tal desmoronamento, caso se realizasse, por assim o exigir a honra da Humanidade. ( Refere  a Guerra do Paraguai)

     “Ao concluir estas linhas, julgamos de estrito dever dirigir um apelo ao diretor real da política brasileira, o Sr. D. Pedro II. Todos os partidos estão acordes em reconhecer que é Sua Majestade quem realmente governa este país; assuma, pois, francamente, uma Ditadura Republicana (Ditadura*), que, até hoje, tem exercido com os disfarces constitucionais, em prejuízo da ordem e do progresso. A nossa questão não é discutir quem dirige os destinos do país, e, sim, exigir que o diretor, quem quer que seja, obedeça as necessidades de sua época.(*) http://societocratic-political-regime.blogspot.com.br/2014/02/pronunciadura-republicana.html

      No Brasil, a ditadura republicana é uma necessidade; os parlamentos manifestam-se de uma incapacidade, só comparável à anarquia que neles reina: para prová-lo, bastaria a questão que se agita. Tivesse o Imperador à coragem de, romper com a política seguida até hoje: elevasse-se ao nível das aspirações do seculo e haveria de conseguir o esquecimento dos erros de seu longo reinado.
( O mesmo acontece agora - 2015)

      Entre as medidas, então propostas por Teixeira Mendes, figuravam:

      1ª) Supressão imediata do regime esclavagista;

      2ª.) Adstrição, ao solo, do ex-trabalhador escravo, sob a direção dos seus respectivos chefes atuais”.
      
Esta medida, já sugerida, em 1865, pelo positivista Dr. Brandão Junior, foi logo abandonada à vista das ponderações de Pierre Laf­fitte, assim expostas por Miguel Lemos:

      “Esta solução, que, à primeira vista, seduz, porque parece estar de acordo com os precedentes históricos, e que tem sido de novo preconizada nestes últimos tempos, não resiste, contudo, a ligeiro exame. Com efeito, os que apregoam semelhante reforma, esquecem que, quando ela se operou apos primeiros séculos da idade média, havia, então, um poder espiritual acreditado e cheio de prestígio, o qual serviu de intermediário natural entre os servos e os senhores, fiscalizando a ação destes e promovendo à emancipação final daqueles. A ausência completa de um poder equivalente, na situação contemporânea, tornaria ilusória semelhante transformação, e a nova servidão apenas teria conseguido mudar o nome à verdadeira condição do escravo, que continuaria no mesmo estado, ou, antes, mais exposto à senhores”.

      Tal ponto de vista imediatamente adotado por Teixeira Mendés, o qual já o sustenta na forte apreciação sociológica da evolução brasileira, que efetuou, a 7 de Setembro de 1881, em substanciosa conferencia pública, estampada com o titulo de “Pátria Brasileira”:

      “A situação social oferece maiores obstáculos do que a situação moral. Com efeito, das quanto classes que constituem o regime industrial, só três se acham em coedições idênticas às do resto do Ocidente.

      “Na indústria fundamental, porém, - a agricultura, - a massa do proletariado conserva-se escrava. Essa escravidão difere essencialmente da escravidão antiga, que foi o resultado da conquista. Não só esta se operava entre povos de civilizações quase idênticas, mas, ainda,  seu estabelecimento denota um progresso no sentimento humano, quando o vencedor conserva a vida ao vencido, em vez de sacrificá-lo, ao passo que a escravidão colonial resultou da invasão do Ocidente, anarquizado pela ruptura do laço espiritual, nas, míseras populações fetichistas da África, e depois de se haverem libertado os servos na Europa católico-feudal. Ela denota portanto, uma degradação moral.

       “Transportadas para a América portuguesa, foram as vitimas da crueldade mercantil transformadas em simples máquinas de produção. Preocupados, exclusivamente, com o ganho, os senhores deixaram-nas entregues aos vícios compatíveis com o acréscimo dos lucros materiais e aplicaram as eminentes qualidades afetivas da infeliz raça em desenvolver as virtudes favoráveis à saciedade de sua execranda cobiça.

      ”O Catolicismo degrado não teve fôrças para condenar a maldita instituição; e contemplou-se o infame espetáculo de sacerdotes possuidores de escravos. Ainda mais: em nome de Deus, o confessor absolvia os pecados que os senhores toleravam, e aconselhava as mesmas virtudes que os proprietários exigiam.
      “Eis aí como se formou sob a influência da hereditariedade, esse espectro miserando de homem, que se denomina o escravo moderno, e cuja situação complica hoje  nosso problema social; tornando impossível a satisfação imediata dos mais ardentes votos dos corações brasileiros. Porque, si foi preciso longo tempo para formá-lo, tempo será também necessário para reparar o imenso crime de que somos responsáveis e de que é solidário o Ocidente inteiro. Mas, assim como essa operação nefanda exigiu o concurso de medidas políticas e de aviltamentos morais, assim também o trabalho
de reparação exigirá a convergência de atos do governo e regenerações de indivíduos.


      “As medidas políticas já foram iniciadas pela supressão do iníquo tráfico, e a promulgação da lei de 28 de Setembro: mas, não bastam. Cumpre cortar o mal pela raiz, suprimindo imediatamente o regime esclavagista, isto é, destruindo essa organização monstruosa do trabalho humano, em que o produtor tem todos os ônus e só o administrador todos os benefícios da vida social”.

      Oito anos mais tarde num trabalho feito em colaboração, tendo a data de 27 de Abril de 1888, voltaram Miguel Lemos e Teixeira Mendes a salientar ser a abolição apenas uma fase do problema social brasileiro, continuando, na ordem  

      Eis, de fato, o que dizem no opúsculo – “A Liberdade Espiritual E A Organização Do Trabalho”:

      “A escravidão agoniza. Concluí-se, com sua extinção, o preambulo da questão social no Brasil, que é a mesma de todo o Ocidente: a incorporação do proletariado na sociedade modernahttp://www.doutrinadahumanidade.com/artigos/a_incorporacao_proletariado.htm

 Mas, o termo de um preâmbulo  não é a solução do problema que o supõe.

      “Em vez, pois; de nos entregarmos aos regozijo de uma vitória preliminar, nós que pertencemos aos abolicionistas da primeira hora, vimos lembrar aos nossos concidadãos o programa que, desde 1880, não cessamos de proclamar.

      “Esclarecidos pela verdadeira teoria da natureza humana, que Augusto Comte construiu, os positivistas brasileiros foram os primeiros a proclamar a superioridade afetiva do elemento africano.

 Rompendo com os preconceitos correntes, não temos casado de demonstrar que só o grande desenvolvimento da veneração explica a paciência heroica com que as vítimas aceitaram e suportaram, até aqui o jugo iníquo. Outrossim, temos continuamente posto em evidência as qualidades de sentimento que nos proporcionaram sua influência doméstica e sua fusão com a raça portuguesa. Também as declarações habituais contra a corrupção dos costumes, atribuída ao influxo dos escravos não nos têm iludido, pois sabemos que ela é promovida e alimentada pela devassidão dos senhores, entregues completamente às sugestões grosseiras de seus apetites, por falta de um poder espiritual, condigno.

      “Diremos mais: si a família brasileira escapou da degradação irremediável a que parecia condená-la a corrupção, que vitimou as africanas e suas filhas, foi isso devido justamente à superioridade afetiva, que reconhecemos na raça oprimida. Sirva este testemunho de lenitivo ao martírio que injustamente sofreu é ainda hoje a tortura”

      E, mais adiante, analisando o que Augusto Comte denomina revolução moderna, comentaram, e suas palavras encontram, ainda hoje, entre nós, a maior oportunidade:

      “O desfecho de semelhante revolução não consiste, como vulgarmente se supõe, em substituir, pura e simplesmente, o parlamentarismo atual( o pior dos regimes; regime da irresponsabilidade) pelo parlamentarismo democrático, mais ou menos universalizado, prolongamento do empirismo político, que levou a ensaiar a transplantação, para o resto do Ocidente, do sistema de governo peculiar aos antecedentes históricos da Inglaterra. Tal substituição, no estado positivo em que a fundação da sociologia cientifica, por Augusto Comte colocou a arte política, é apenas uma puerilidade, cujo nenhum valor já está sendo sentido por muitos.

      A revolução moderna tem um objetivo mais elevado: o estabelecimento da república, no sentido próprio deste vocábulo, isto é, tende para o estabelecimento de um regime exclusivamente baseado na consideração preponderante do bem público como lei suprema.

      E, expondo as vistas de Augusto Comte sobre a questão social, ressaltam, nesse opúsculo, Miguel Lemos e Teixeira Mendes, de modo extremamente penetrante, a conciliação espontânea entre o capital e o trabalho, refutando, assim, os sofismas ventilados pelo comunismo.

      Assinada a Lei Áurea, comentou-a luminosamente Miguel Lemos na 8ª. Circular Anual, relativa ao ano de 1888:

      “Nunca, em nosso país, se excetuarmos talvez os tempos de nossa Independência, a opinião pública obteve um triunfo tão brilhante e tão decisivo. E também nunca uma medida desta ordem foi decretada e levada a efeito com uma calma e tranquilidade mais completa. Foi entre flores e ovações, ao som de cantos festivos e de aclamações populares, que se vibrou o último golpe contra a infame instituição, cuja persistência nos fazia corar à face da civilização moderna.

      “Pode dizer-se que, nesta questão, o governo não fez sinão levar ao parlamento, para o promulgar em seguida, um decreto muito antes lavrado pela opinião pública. Porquanto, cumpre reconhecê-lo, a abolição já estaria feita há muito tempo si o imperador atual houvesse tergiversado menos com os interesses escravistas e si houvesse mostrado a energia exigida pela sua alta função politica.’ Sentindo que privilegio monárquico se achava intimamente ligado á conservação do privilégio oriundo da escravidão, mas, movido também pelos reproches da opinião nacional e estrangeira a fazer alguma coisa no sentido libertador, sua conduta neste grave assunto não foi sinão uma constante indecisão, determinando, nos abolicionistas, grandes esperanças, seguídas logo depois de profundas desilusões. Ele teria fatalmente chegado ao termo de seu longo reinado sem ver o fim da odiosa anomalia si a regência de sua filha, durante a sua viagem recente à Europa, não tivesse oferecido à vitória da opinião pública uma oportunidade mais favorável.

      “Com efeito, estou convencido de que, com o Imperador atual, nunca teríamos tido a abolição completa, ou, pelo menos, tal qual foi decretada, sem nenhum prazo legal e sem nenhum desses regulamentos opressores destinados, sob pretexto de proteger os libertos, a prolongar a sujeição deles. Cumpre, entretanto, no quinhão de glória que cabe à Regente por este passo. capital, distinguir entre a monarquia e a Princesa.

      Á instituição monárquica não podia ser favorável à abolição, porque esta lhe tirava o último apoio junto ás classes conservadoras do país, onde aquela instituição não tem nem, tradições, nem raízes. O procedimento do Imperador nesta questão traduz bem, como venho de notá-lo, a situação contraditória em que se via colocada nossa monarquia, impelida, por um lado, pelo clamor da opinião nacional e estrangeira, a marchar no sentido da abolição sem demasiada demora, e, por outro lado, hesitante e atarantada nesta marcha, por sentir que a  ruptura do pacto, tacitamente feito com as classes interessadas na manutenção do elemento servil, acarretaria consigo sua própria ruma.

   “A Princesa Isabel não tinha certamente, como seu velho paí; o sentimento dessas incompatibilidades, ainda agravadas, no soberano atual, pela sua inaptidão política. Ela não procurou, resistir à corrente dominadora da opinião pública, e obedecendo, como mulher que era, à inspiração preponderante do coração, não hesitou em despedir um ministério retrógrado (5) e em chamar, ao poder, um chefe político, conhecido pela sua atitude favorável à abolição. O advento de um novo ministério, que se sabia disposto a favonear a corrente abolicionista, acelerou, como era de prever, o desfecho da grande questão. A partir desse momento a abolição imediata e incondicional se impôs ao governo, como única medida capaz de satisfazer as reclamações instantes da opinião pública. A Regente e seu ministério tiveram; desta, vez, o mérito de aceitar; francamente, a única solução possível, sem tentar novos paliativos.

   “Reduzida, assim, às suas justas proporções, a parte que, neste ato memorável, cabe à Princesa Regente, não pode ela merecer, nem, os elogios excessivos de seus panegiristas, nem os ataques inconsiderados de seus adversários”.

   ‘Socialmente - diz Teixeira Mendes em notável carta aberta a Joaquim Nabuco a propósito da agitação republicana — o ato da Sra. Dona Isabel teve o mérito de prevenir conflitos, talvez sanguinolentos.

   “Não há dúvida de que se faria totalmente a abolição em breve prazo, fosse qual fosse a atitude da ditadura imperial. Importa, porém, notar que, assumindo a direção do movimento contra o parlamentarismo burguesocrático, impediu o Governo as lutas eminentes e os ressentimentos, que sempre deixam àpós si. Pessoalmente, o órgão de tal reforma, apesar de sua adesão vir no último momento, devia estar certo de conquistar as simpatias do povo, sempre disposto a avaliar pêlas suas alegrias, como pelos seus sofrimentos, o mérito dos que governam.

   “Não se pôde, Dois, dizer, com exatidão, que a Sra. Dona Isabel sacrificou a Monarquia, concorrendo para a lei de 13 de Maio. Sem esse concurso, a abolição se faria, Monarquia, se eliminaria, e apena Sua Alteza não teria merecido a gratidão, que hoje lhe tributam os brasileiros, e nos positivistas, compartimos de boamente.

   Idêntico ao de Teixeira Mendes e Miguel Lemos é o depoimento de um dos mais gloriosos abolicionistas da primeira hora, Rui Barbosa, não só no belíssimo discurso que pronunciou, em Agosto de  1887, no Teatro Politeama, mas ainda no que preferiu, em Fevereiro de 1892, cujos são os seguintes tópicos:

   “Dai a treze dias a abolição estava consumada.

“Não por obra da caridade imperial. Não! O consórcio do império com a escravidão, indignadamente denunciado pelo Snr. Joaquim Nabuco ainda na derradeira fase da propriedade servil, nunca s dissolveu sinão quando a dinastia sentiu roçarem-lhe o peito as baionetas da tropa, e a escravaria em massa tomou a liberdade a liberdade por suas mãos nos serros livres de São Paulo.

   A tradição viva da verdade militante e que há de ser o Homero dessas glórias, tão cedo maculadas pêla má fé dos interesses e coroar a verdadeira redentora: a vontade impessoal da pátria, apoiada na organização inexpugnável do abolicionismo na cooperação geral da família brasileira, no êxodo caudaloso dos catives, e na galharda nobreza deste exército, que recusou suas armas a caçada de criaturas humanas, prescrita pelos ministros do Imperador”.

   É preciso ter-se presente a participação real de Dona Isabel, na Abolição, afim, de que, na estátua a se lhe erguer, a justo titulo, nesta Capital, seja evitada ’a mentira de bronze”, perpetrada na estatua de Pedro 1 na Praça Tiradentes, conforme o fundado reproche do grave Teofilo Ottôni.

   Todos conhecem o episódio.

   Devia inaugurar-se, solenemente, em 1862, no Rio, a estátua de Pedro I.

   Teófilo Ottôni que em 1860, se recusara ao deprimente “beija-mão”, por pensar não poder o Imperador levar a mal “ver, de ante de si, um homem em pé”, fora designado por duas Assembleias provinciais, trinta e duas Câmaras Municipais e diversas associações cientificas para representá-las na inauguração.

   Recusando o encargo, expôs, pela imprensa as razões pelas quais o fazia.

   Eram, entre outras, as seguintes: a glorificação de Pedro I como o autor de nossa independência e a condenação do movimento popular de 7 de Abril.

   Tratava-se, pois, segundo sua expressão, de inaugurar “uma mentira de bronze”, que o seu civismo lhe não, permitia sancionar com sua presença.

   Sirva a advertência de Teofilo Ottôni para que, respeitando-se a verdade histórica e guardando-se as merecidas e devidas proporções, não se transforme, numa nova “mentira de bronze”, o monumento a ser, a justo titulo (repito), erguido à Princesa Isabel nesta Capital.

   Alguns dias antes da lei libertadora ser apresentada à câmara, e quando ainda se acreditava que a extinção legal da escravatura seria acompanhada, sinão de um prazo, ao menos de regulamentos destinados a prolongar, sob pretextos especiosos, a sujeição dos libertos aos seus ex-senhores, publicaram Miguel Lemos e Teixeira Mendes um folheto combatendo semelhantes medidas, insistindo na necessidade de decretar-se incondicionalmente, a abolição, e expondo o programa político, que deveria o governo adotar em seguida.

   Este opúsculo (intitulado “A Liberdade Espiritual E A Organização Do Trabalho”), indiscutivelmente concorreu para fortalecer, na opinião pública, a repugnância geral que inspiravam as medidas anunciadas.

  Referindo-se a repercussão da Lei Áurea sobre o advento da República, faz Teixeira Mendes, ainda em colaboração com Miguel Lemos, as seguintes ponderações num escrito que obteve grande aceitação, consagrado á pleitear “Á Liberdade Dos Cultos”, e publicado em setembro de l888:

  “Ä lei de 13 de Maio não veio  determinar convicções e sentimentos republicanos em quem os não tinha; porque tal lei seria incapaz de destruir as opiniões monarquistas naqueles, em que essas opiniões realmente existissem. A verdade e que, pelos nossos antecedentes históricos, a monarquia não possuí, entre nós, aderentes reais. A sua manutenção atual representava apenas a defesa de certos interesses egoístas, só e exclusivamente; e esses interesses se resumiam na escravidão. ( Hoje a escravidão é de outra forma apresentada). Abolida esta, nenhuma outra consideração liga ao trono a massa ativa da nação.

  “Portanto, si é verdade que os neo-republicanos, vindos da escravocracia, não são republicanos de fato, porque o bem público está longe de ser o principio em que se inspiram, não é menos verdade que abandonaram a monarquia por não serem também, de fato, monarquistas.( representados hoje pelo PMDB, PSDB, DEM e outros) 

  “Si assim não fosse, em vez de aceitar a solução republicana para o problema político, eles se teriam limitado, para satisfazer os seus despeitos, a planejar simplesmente uma mudança de dinastia. 

Por que o não tentaram? 

Justamente porque as instituições não lhes mereciam outro apego que não o de seus próprios interesses, por um lado. E, por outro lado porque só na República encontravam as simpatias populares capazes de apoiar  seus projetos contra a dinastia imperante; (a Atual Oligarquia Financeira Brasileira.)

  “Pode-se tambem assegurar que nenhum verdadeiro estadista deixará de ter reconhecido que as atuais concessões do Govérno Imperial são impotentes para consolidar, entre nós, as instituições monárquicas. Todas as liberdades que possuímos, devemo-las aos nossos antecedentes históricos, e não à forma de governo adotada por nossos antepassados. A prova é que essa forma de governo, em outros países, não deu os mesmos resultados. Também seria  fácil, examinando a história, demonstrar que a  nossa situação não é devida à capacidade política dos chefes, que esses antecedentes nos deram. Os Governos, entre nós, têm ‘sido, continuamente, dirigidos, em vez de diretores, custando-nos a sua imperícia o agravamento dos vícios inerentes à fase revolucionária que atravessamos.(Até Hoje)

  “Esta subordinação anormal é mesmo incontestável nos dois memoráveis acontecimentos em que maior foi a intervenção da ditadura monárquica.

  Referimo-nos á nobreza de Pedro I pondo o seu prestígio histórico ao serviço de nossa independência, e à gloriosa iniciativa da Sra. Dona Isabel, na promulgação da lei de 13 de maio.

  “A monarquia tem tão poucas rizes nos sentimentos altruístas e nas convicções nacionais, que a justa gratidão popular, que hoje cerca a S. A. a Princesa Imperial, é incapaz de cimentar-lhe o trono”.

  E, ainda em 1888, no precioso opusculo.

 "Abolicionismo E Clericalismo”, com que respondeu a um artigo de Joaquin Nabuco, protestou esmagadoramente Teixeira Mendes contra a lenda, que já então se começava a insinuar, a propósito do abolicionismo do “Magnânimo” e da Igreja católica:

  “No que concerne especialmente à abolição, devemos notar que atribuir ao Snr. D. Pedro II, pelos tíbios desejos e opiniões que manifestou, um papel mais saliente do que o que coube a   seus ministros, vale tanto quanto atribuir-lhe as glórias militares de Caxias(**) e Osório. O me rito, aliás pequeno, desses ministros está justamente em terem consagrado seu talento e a sua atividade à solução que lhes foi encomendada, ao problema abolicionista; assim como a condenação do imperante consiste, justamente, em só lhes haver encomendado o mínimo que era possível. Demais, basta considerarmos que os escravos dados em uso-fruto à coroa, bem como os da nação, só foram libertados pela lei de 28 de Setembro de 1871 para nos convencermos de quão tímidas eram as aspirações abolicionistas de Sua Majestade. E, no entanto, já em 1865, o exemplo dos Estados Unidos da América do Norte devia servir-lhe do mais eficaz incentivo. 
 (**) http://www.doutrinadahumanidade.com/artigos/a_incorporacao_proletariado.htm
  Em suma, não se pode apreciar melhor o valor do abolicionismo do atual imperante do que repetindo as palavras de Cochin em seu livro, escrito em 1861, sôbre a abolição: http://www.jstor.org/stable/1407222?seq=1#page_scan_tab_contents

  “Sendo o poder no Brasil, concentrado, a abolição dá escravatura não apresenta, aí, as dificuldades que encontra o Congresso dos Estados Unidos. A indenização não é um ônus impossível de suportar num país cujas finanças e cujos créditos são prósperos: pôde ser paga, em parte; por alguns anos de adiantamento. Será, sobretudo, mui diminuída si se aplicarem literalmente, como de direito, as leis e os tratados que declaram livres os escravos introduzidos pelo tráfico. Si se tentasse uma revisão severa da maneira pela qual vieram os escravos as mãos dos proprietários, ficariam muitos cuja posse se pudesse justificar?

  “Em resumo: a origem da escravidão, no Brasil, é infame: sua manutenção, sem escusa; sua abolição, sem dificuldade politica”.

  Em 1913, no opúsculo “O Império Brasileiro E À República Brasileira Perante a Regeneração Social”, escrito a propósito do Manifesto de D. Luis de Bragança, depois de historiar o movimento abolicionista a partir de José Bonifácio, assim, recorda Teixeira Mendes a atuação de D. Pedro II.

  “O abolicionismo do ex-Imperador levou até 1856 para acabar com o tráfico negreiro, apesar da enérgica interferência da Inglaterra; até 1864 para emancipar os africanos livres, até o fim de 1871 para libertar os escravos da nação e os dados, em uso-fruto, à Corôa, e impedir, de um ‘modo imperfeito, a dissolução da família escrava, e decretar a liberdade dos nascituros de mulher cativa, sujeitando-os, porem, até os 21 anos, ao domino corruptor dos senhores. Esse tíbio abolicionismo ainda em 1885 taxava o preço da libertação dos escravizados, acautelando a cu biça dos verdugos dules; e, em 1886, apenas em parte revogava uma perversa legislação criminal. Não lhe repugnou abusar da situação crítica da República Oriental do Uruguai afim de lhe impor, em nome da Santíssima e Indivisível Trindade, a entrega dos escravos que lá focem buscar abrigo contra a tirania de seus algozes; e nem se pejou de promulgar o decreto (de 6 de Novembro de 1866), que retirou do cativeiro os escravos da nação para mandá-los morrer em defesa do pavilhão imperial’

  “Devemos, enfim, notar o silêncio das falas do trono quanto à abolição apesar de várias manifestações na Câmara, no senado e na impressa, em prol dos escravos, ate que o sentimento imperial fosse incitado pela mensagem da junta francesa de emancipação, em Julho de 1866.

  ‘Acrescentaremos que, na sessão da Câmara  dos Deputados, a 10 de Maio de 1888, quando       ainda a lei abolicionista passava pelas formalidades parlamentares, o Snr. Afonso Celso Junior apresentou um projeto “Considerando de festa nacional o dia em que fosse sancionada a lei que declara extinta a escravidão no Brasil”

  “Esse’ projeto foi enviado no dia seguinte, 11 de Maio de 1888, à Comissão de Constituição e Legislação.

  “E, não havendo tal Comissão dado seu parecer até 11 de Maio do ano seguinte (1889), o Snr. Afonso Celso Junior requereu, na sessão desse dia (11 de Maio de 1889), urgência para a discussão do aludido projeto, independentemente de parecer. Aprovada a urgência, entrou o projeto a 17 de Maio de 1889, em primeira discussão, a qual foi no mesmo dia encerrada, após um debate assaz característico das disposições das classes dominantes em relação a esse passo capital. Enfim, foi o projeto rejeitado a 20 de Maio desse mesmo ano de 1889, obscura votação anônima.

  “Tornou-se, destarte, necessário nesse a Republica para que a comemoração oficial dessa data demonstrasse a harmonia que felizmente se estabelecera, enfim, entre as mais nobres aspirações do povo brasileiro e a atitude do seu Governo”.

  Quanto à outra lenda, isto é ; o abolicionismo da Igreja Católica que só se manifestou através de raros padres, falando sempre em seu nome individual, transcreve Teixeira Mendes os seguintes trechos do Relatório de Miguel Lemos, concernente ao ano de 1887:

  ‘É nesta hora, quando todo mundo se tornou abolicionista, inclusive os próprios lavradores, que os nossos bispos católicos, em pastorais publicadas anunciando o jubileu sacerdotal de Leão XIII, ( http://w2.vatican.va/content/leo-xiii/pt/encyclicals/documents/hf_l-xiii_enc_15051891_rerum-novarum.html ) julgaram oportuno erguer a em favor da abolição, reeditando, por esta ocasião, as velhas chapas sobre o pretenso antagonismo entre a luz divina do Evangelho” e a escravidão do homem. Não cabe aqui mostrar que essa incompatibilidade não existe e que, sob o ponto de vista do dogma, a questão é indiferente para o cristão, cuja preocupação deve ter por alvo a conquista do céu, aceitando este mundo como um exílio passageiro. Contentar-me-ei em lembrar que “a luz divina do Evangelho”se concilia tão bem com a escravidão que não só vários Papas tentaram, no principio, justificá-la quanto aos africanos , mas os padres católicos, sem executar as corporações monásticas, tornaram-se, sem escrúpulo, senhores de escravos. Posso acrescentar que um bispo brasileiro, um dos mais ilustrados predecessores dos que hoje se recordaram, tão tardiamente, de ser a escravidão contrária à religião cristã, defendeu e procurou demonstrar, outrora, a legitimidade do infame tráfico: (As memórias de D. José J. da Cunha de Aze­vedo Coutinho, Bispo de Pernambuco, 1743-1821).

  “Contra um tal conjunto de provas dogmáticas e históricas podem-se, apenas, citar algumas bulas papais, inteiramente platônicas em suas intenções e nos seus efeitos. {O que foge hoje em dia das visões  do Papa Francisco http://w2.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html  
  “Neste assunto a confusão resulta da admirável cooperação do clero católico da Idade Média na obra de libêrtação dos escravos antigos, em que o sacerdócio foi o órgão das aspirações sociais da época, independentemente de toda influência direta. Então o clero se achava à testa do movimento social, e, dado o vago inerente a toda doutrina teológica, ­era-lhe fácil ajeitar esse dogma, sob o impulso do sentimento social, à defesa das novas necessidades, assim como mais tarde, esse mesmo clero degradado soube adaptar o mesmo dogma a defesa de todas as retrogradações. Assim, pois, cumpre não nos iludirmos, atribuindo à doutrina o que, na Idade Média, não foi senão um resultado da situação social e das eminentes naturezas sacerdotais, que, então, honraram o catolicismo. E que tem voltado a ser honrado com o Papa Francisco em 2015.

  “Voltando, porém, aos nossos bispos, é o  caso de dizer-se: “antes tarde do que nunca”. 

Entretanto, é necessário que fique firmado que só depois que todos os poderosos deste mundo se declararam favoráveis a abolição, quando já não ha nenhum perigo temporal ou espiritual em se fazer profissão de fê abolicionistas, é que os diretores das almas, os pastores do povo cristão, julgarem oportuno falar à favo dos escravos. Esta verificação era necessária afim de que a estima pública, que deve tocar a todos os que se consagraram à obra da abolição, não possa servir indefinidamente para prolongar á situação privilegiada da igreja católica entre nós, isto e, não possa demorar a plena liberdade espiritual de que carecemos’.

  Confirma as considerações de Miguel Lemos sobre a atitude do clero católico relativamente à escravidão do Brasil, o seguinte tópico da Representação” elaborada, em 1823, por José Bonifácio:

  “A nossa religião é pela maior parte, um sistema de superstições e de abusos anti-sociais (esta linguagem do Patriarca lembra a do Sr. Getúlio Vargas na conhecida e aplaudida entrevista, que concedeu, em 1925, ao “O País, do Rio, a propósito do ensino religioso nas escolas oficiais); o nosso Clero, em muita parte ignorante e corrompido, é o primeiro que se serve de escravos, e os acumula para enriquecer pelo comércio e pela agricultara e para formar muitas, vezes, das desgraçadas escravas um harém turco.

  Ainda em 1870 os frades das Mercês e do Carmo matricularam, no Maranhão, respectivamente, 46 e 157 escravos!

  Consigna Evaristo de Morais, em sua primorosa “A Campanha Abolicionista”, vários anúncios de Padres prometendo, em 1887, gratificações aos que lhes prendessem os cativos fugidos, e observa que, até Agosto mesmo ano de 1887, nunca se manifestara simpático à abolição o semanário católico, “O Apóstolo” que se editava no Rio.

  Daí dizer, no “ O Abolicionismo”, Joaquim Nabuco, cujo depoimento não pode ser taxado de suspeito:

  “Entre nós, o movimento abolicionista nada deve, infelizmente, à Igreja do Estado; pelo contrário, a posse de homens e mulheres pelos conventos e por todo o clero secular desmorra lizou inteiramente o sentimento religioso dos senhores”.

  Eis, para terminar, como Miguel Lemos, logo, após a Abolição, resumiu seus próprios esforços e os de Teixeira Mendes na gloriosa

  1ª) Introduzimos, na propaganda abolicionista, um ponto de vista novo, fazendo conhecer a teoria das raças, devida a Augusto Comte. Mau grado os preconceitos correntes, compartidos pelos próprios abolicionistas, mostramos, segundo os ensinos de nosso Mestre, que à raça africana competia a superioridade afetiva sobre as outras duas (branca e amarela), e que somente assim se podia explicar a sua atitude resignada durante todo o tempo que durou a triste opressão a que fora tão injustamente reduzida.

  2ª) Reproduzindo ainda as lições de Augusto Comte, mostramos a distinção a estabelecer entre a escravidão antiga, resultado normal da evolução humana, e a escravidão moderna, restabelecida no Ocidente após os grandes descobrimentos marítimos do XV século.    Dissipamos, assim, os sofismas dos que, para justificar a escravatura existente em nosso país, recorriam a argumentos aplicáveis somente à civilização antiga.

  3ª) Tomando conhecidos os vários tópicos das obras de Augusto Comte relativos a essa questão, trouxemos, ao abolicionismo radical o potente apoio da autoridade de nosso Mestre contra os sofistas que reclamavam uma impossível e ilusória transformação gradual e sustentavam um pretenso direito de indenização pecuniário.

  4ª) Contribuímos, finalmente , com o nosso exemplo pessoal; sem virtude do preceito que proibia aos membros do nosso núcleo positivista toda espécie de posse de escravos. Fomos a única Igreja, e mesmo a única associação, que eu saiba, que assim se esforçou pôr juntar a prática à teoria.

  “Recordando esta luta memorável, que acaba de ser encerrada, pela lei de 13 de Maio, podemos prestar-nos a nós mesmos o nobre testemunho de ter também concorrido para um resultado tão desejado; pondo ao serviço da causa da abolição as luzes bebidas nos ensinos do nosso mestre e a conduta pessoal e cívica, que deles decorria.

  “A abolição da escravatura devia, como era natural, despertar em nossos artistas, o desejo de idealizar um acontecimento tão considerável. Entre as diversas tentativas, que visaram esse fito, limitar-me-ei a assinalar o quadro projetado pelo pintor Décio Vilares. Este distinto artista, colocado cm situação feliz pelas suas inspirações positivistas, concebeu uma grande tela destinada, não a fazer a apoteose dos branco, os quais tão tardiamente haviam reparado um crime coletivo três vezes secular, mas a glorificar os serviços prestados pela raça infeliz a constituição física, moral e mesmo intelectual de nossa nacionalidade. Não podíamos deixar de apoiar, na medida de nossa influência, uma comemoração tão bem inspirada e instituída, e cujo mérito contrastava com a falsa banalidade das composições habituais  deste Gênero. Com este propósito publicamos uma apreciação filosófica do quadro projetado, fazendo sobressair seu alto valor estético e social, e solicitando o concurso material e moral de nossos compatriotas para uma obra tão digna de incentivos.

  “Uma subscrição pública foi, de fato, aberta pelo próprio artista em favor do seu quadros o qual, uma vez terminado, será gratuitamente doado ao Paço de nossa municipalidade. É de esperar que o apôio do público brasileiro não falte ao nosso eminente artista”.

  É o seguinte o titulo do opúsculo a que se refere Miguel Lemos: “A Epopêia Africana no Brasil”, quadro do Sr. Décio Vilares. Adesão motivada e apelo ao povo brasileiro, por Miguel Lemos e R. Teixeira Mendes. Rio, 1888”.

  Durante longos anos, comemorou Teixeira Mendes a Lei Áurea, não só através de artigos e opúsculos, mas ainda por meio de conferências, no Templo da Humanidade, em que, rememorando a figura inconfundível de Tousaint Louverture(***), refutava os preconceitos relativos à inferioridade étnica do povo brasileiro, salientando o valor afetivo, mental e pratico da contribuição negra na formação de nossa nacionalidade.  (***) http://www.doutrinadahumanidade.com/artigos/haiti_toussaint-louverture.htm
  A mais curiosa, porém, de todas as suas intervenções, posteriores ao 13 de Maio (e que pinta bem o  seu feitio imoral, havendo sido admirada até por um cético do estofo de Medeiros e Albuquerque), foi o trabalho que tomou para desfazer a versão propalada, na Inglaterra, dê haver Pedro II dirigido uma mensagem a Lincoln, intercedendo a favor dos escravocratas da América do Norte, mensagem esta dada à publicidade, em 1917, por Frederico Harrisso, e espalhada, através do telégrafo, por todo o mundo.

  Convencido de tratar-se de uma mistificação, e que Pedro II, apesar da tibieza de seu abolicionismo, não seria capaz de tal infâmia, não descansou Teixeira Mendes até patentear a burla do célebre e prestigioso escritor, o qual, além do mais, passava por um dos chefes do positivismo inglês, havendo sido quem promoveu a publicação do conhecido “Novo Calendário dos grandes homens”. até 1789. http://sccbesme-humanidade.blogspot.com.br/2015/05/calendario-positivista.html
   Para tal, entrou Teixeira Mendes em ativa correspondência com jornais da América do Norte e da Europa, desvendando afinal, de modo irrefutável, a falsidade da mensagem em apreço. E, em 1918, consignou os resultados de suas pesquisas em artigo publicado nos “A Pedidos” do Jornal do Comércio’ e depois estampado em avulso com o titulo:” Em Deseja do Passado Brasileiro: falsidade da esmagadora agravante que, para a deplorável política imperial brasileira, resultaria da inqualificável intervenção escravocrata, malignamente atribuída a Pedro II junto a Lincoln”.

   Assim, si fora sincero ao salientar, em 1888, a fraqueza do abolicionismo do Magnamismo, quando este ainda se achava no poder, não menos o foi Teixeira Mendes, em 1918, ao defender-lhe, com desvelo, a memória contra uma acusação inteiramente injusta, a qual viria, si procedente, agravar os erros e culpas desse imperante, de que se constituíra o espontâneo defensor, quando, havia perto de três décadas, fora destronado e deixara de existir.

   Bem merece, pois, minhas Senhoras e meus Senhores, a rememoração, que dele ora fazemos, Teixeira Mondes, abolicionista mais militante do que qualquer dos grandes propugnadores da Lei Áurea, porquanto, para ele, esta constituía, apenas, uma etapa da questão social brasileira, cuja solução definitiva, conforme demonstrava em constantes prédicas e escritos, só seria conseguida mediante o que Augusto Comte denominou a incorporação do proletariado na sociedade moderna.

   A única maneira digna, portanto, de comemorar a atuação abolicionista de Teixeira Mendes, é prosseguir-lhe os esforços em prol desse ideal ainda hoje de máxima atualidade, mediante a solução científica de Augusto Comte, igualmente distante da anarquia e prepotência comunista e da retrogradação e tirania fascista.

   Como preito de gratidão à memoria venerável do glorioso autor da Bandeira Nacional, recordemos o que mais tocaria ao coração de quantos lhe foram prestados por ocasião de sua morte, isto é, as singelas palavras que,  a respeito dele, proferiu, do púlpito da Igreja, de Nossa Senhora de Loreto, a 3 de Julho de 1927, o Vigário de Jacarepaguá, Exmo e Rev-mo Snr. Padre Paulo Maria de Lecouriéux.

   “A pátria brasileira acaba de sofrer uma perda, sensível na pessoa do Snr. Raimundo Teixeira Mendes, que expirou na sua residência,  à rua Benjamin Constant. Dotado das mais eminentes qualidades de espírito e coração, consagrou o extinto a vida inteira ao culto e amor da humanidade, pregando a mais ampla fraternidade aos concidadãos.

   ‘Ele é o autor de interessantíssimos opúsculos sobre a liberdade espiritual, e tive a honra e o prazer de ser o porta-voz de seus primeiros, conformes aos nossos, na Liga Pedagógica, combatendo a doutrina do monopólio do estado sobre a liberdade do ensino e a necessidade de antes promover a educação do sentimento ( altruísta) do que combater o analfabetismo. “A inteligência - dizia ele - age sob o influxo do coração”. http://www.doutrinadahumanidade.com/artigos/a_harmonia_mental.htm
    “Foi um devotado campeão do abolicionismo, ardoroso propagandista, do regime republicano para cujo estabelecimento grandemente concorreu, sendo o criadora atual bandeira brasileira.

   ‘Fiel aos seus princípios filosóficos, foi sempre um convencido defensor das prerrogativas do “venerando e glorioso catolicismo” (eram suas expressões). Ele levantou a voz a favor dos jesuítas portugueses expulsos, atacando o egoismo do nosso governo que lhes recusava o agasalho. Bateu-se, igualmente, para que à Igreja Catolaica fossem asseguradas a propriedade e a posse de seus bens, assim como dos das ordens religiosas. No decreto de separação da Igreja e do Estado, sugeriu o nobre extinto que se fizesse a reforma ‘com ó maior respeito à majestade do culto católico, bem como à situação pessoal dos Sacerdotes, que então exerciam cargos eclesiásticos”, devendo ser mantida a côngrua que percebiam, o que foi aceito.

   “Todos os anos, como o afirmou a mim, pessoalmente, ele mandava a quantia de 200 francos ao Arcebispo de Paris para a mantença do culto católico, segundo o testamento do Mestre.

   “Foi o maior inspirador da ideia de se erguer um monumento, na praia do Russel, a São Francisco de Assis, dedicando-se, a esta obra até aos últimos instantes da vida, e escrevendo uma biografia do glorioso Patriarca Seráfico, a qual acaba de ser impressa.

   “Podemos afirmar ter ele morrido vítima de seu amor ao grande santo do século XIII, pois passava as noites frias de inverno no templo da Humanidade, dirigindo a modelagem do monumento, a ser inaugurado a 3 de Outubro do corrente ano. Nesta tarefa, o rigor da estação, as chuvas, às quais ele se expunha, para apressar o triunfo do grande Patriarca, lhe causaram uma angina rectoria, que o vitimou em 10 minutos.

   “Não é sem emoção que um Padre Católico lembra estes detalhes, os quais mostram claramente que si a fé abandonou a inteligência do Snr. Teixeira Mendes, o seu coração era embebido de tal forma nó sentimento católico que este inspirava, a cada momento, sua grande alma. A arte positivista nada mais impressionante ostenta aos nossos olhos do que o quadro da Virgem Mãe, que, oficialmente, representa Clotilde de Vaux, mas tomou seu símbolo, evidentemente aos mistérios do Cristianismo.

   “Lembrando os inestimáveis serviços prestados à causa católica pelo nobre Snr. Teixeira Mendes, o vigário da paroquia onde êle residia, fez uma visita à família do morto.

   Ultimo na ordem da dignidade, o Vigário de Jacarepaguá, que aprendeu a conhecer e amar ésse grande, coração e gozava de franca simpatia do extinto, apresenta, à família enlutada, a expressão de seus profundos pêsames lhe recomendá a alma às orações de seus paroquianos.

      “V. “Jornal do Brasil” de 20 de Julho de 1927).

      Que mais eloquente e mais tocante conste geração do grande abolicionista, cuja atuação comemoramos, do que esse espontâneo e comovido panegirico feito por um velho, ilustrado e virtuoso sacerdote católico, o qual, não contente de proferi-lo, no dia 3 de Julho de 1927, na Igreja de Nossa Senhora de Loreto, o reproduziu, no dia 5 desse mesmo mês, na festa patronal do Externato de Santo Antônio Maria Zacarias?

      Patinas, pois, minhas Senhoras e meus Senhores, palmas mil, quer sejais católicos, ou apenas cristãos, positivistas, ou livres-pensadores, deístas, materialistas, ou ateus, palmas mil à memória desse grande incansável e abnegado propugnador da Abolição e de tantos outros nobilíssimos ideais, que se assinava, em vida, Raimundo Teixeira Mendes, Apóstolo da Humanidade.

      Pelo Proletariado, que, embora livre, a anarquia mental do ocidente mantem acampado na sociedade moderna - sem domicílio, sem  infância, sem adolescência e sem mãe, porque os trabalhos externos a absorvem e consomem; com o hospital para a moléstia, o asilo para a velhice, as mesas dos anfiteatros é a vala comum para a morte; por esse proletariado em seu tempo inteiramente deixado ao desamparo das flutuações humanas, a voz retumbante de sua indignação e de seu zelo clamou a vida inteira, defendendo-o e alevantando-o.

      Não foi mera coincidência haverem sido as, seguintes as últimas palavras por ele escritas em seu diário “Lunedia - 10 de Carlos Magno de 73/139 (27 de Junho de 1927).

      As estátuas (de São Francisco de Assis e de Santa Clara) ficaram engradadas às 10 h 50 m da noite. Acabou-se o serviço às 11 1/2 h. Estou com dores nas costas desde 8 h. da noite, ora mais fortes, ora mais fracas; quando aliviam, voltam ao menor esfôrço. Já no sábado me aconteceu o mesmo”.
       Teixeira Mendes, minhas Senhoras e meus Senhores, só podia, de fato, ingressar na imortalidade preocupado com o “Poverello”, por quanto, em seu meio século de apostolado, fora sempre proletário de coração proletário de proceder, simpatizando com todas as agruras e com todas as alegrias de quantos desamparados havia no mundo, numa transfiguração moderna de São Francisco voluntariamente casado casado com a pobreza!’

NOTAS

       (1) De como era tratada, pela família de Benjamin, uma ex-escrava de seu sogro, Dr. Cláudio da Costa, é eloquente testemunho o seguinte trecho de uma carta de Benjamin Constant Filho.

       A carta, datada de 1895, é dirigida a uma de suas irmãs, e neta alude o missivista á morte dessa ex-escrava, que lhes servira de Mãe-Preta:

       “Só hoje posso mandar-te a lembrança que me pediste de nossa pobre Luísa, que morreu longe de todos aqueles que a amavam e a quem ela amava sinceramente, profundamente, com essa ternura humilde e essa dedicação de todos os instantes, que fazem do africano o tipo mais belo da alma humana. Eu quis arranjar-te o rosário em que, todas as noites, ela rezava, acreditando, na sua santa simplicidade de espirito, que era esse o único meio de ser útil àqueles a quem dedicava toda a pureza de sua alma, como si a sua vida inteira de dedicação e lealdade, parte da qual se passara nos martírios do cativeiro humilhante, não fosse mais, muito mais valiosa do que todas as preces!

Eu quis arranjar-te o seu rosário, porque foi o confidente das suas preocupações amorosas por toda a nossa família, a quem acompanhou quais uma existência inteira, e do seu amor, amor por min, por ti e por Arací, que ela distinguia no seu afeto, por nos ter criado desde que viemos ao mundo”.

(2) Depois de transcrever certos da petição que, por proposta de Benjamin Constant, dirigiu Deodoro à Princesa Isabel, em nome do Clube Militar, comenta Osório Duque Estrada:

“Estava feita, de fato, a Abolição. Todas as concessões, que, daí por diante, pretendesse o governo fazer, seriam recebidas como tentativas contemporizadoras, ou meros expedientes protelatórios”.

(V. Osório Duque Estrada: “A Abolição” pgs. 216 e 217 da 1ª. ed)..

Não fora outra a conclusão do contemporâneo Cristiano Ottôni:

“No princípio de 1888 a escravidão estava abolida de fato, revolucionariamente: tramalhava quem queria; todo escravo, que abandonava seu senhor, achava logo quem o asilasse e as autoridades nem tinham força para prendê-los, nem se atreviam a aplicar, aos acoutadores, a pena da lei de 1885, que continuava a ser lei morta.

  “O característico da escravidão, que é o trabalho forçado e gratuito, e desaparecia.

“O Clube Militar associação fundada na Côrte e composta dos oficiais mais influentes no exército, deliberaria levar, à presença da Princesa Regente uma petição para que não fosse empregada a fôrça de linha no serviço que reputavam ignominioso, de prender escravos fugidos. O Governo proibiu que subisse ao trono essa representação, mas não pôde impedir-lhe os efeitos. Ou porque a ideia calasse nós ânimos dos oficieis, ou porque o Clube fizesse entre eles propaganda de abstenções é certo que raros destacamentos de linha se prestaram com diligência á repressão da escravatura”.
(Christiano Ottôni, apud Gomes de Castro: “A Pátria Brasileira; pgs. 303 et passim).

(3) José Mattoso Maia Forte em sua bela conferência: “Alguns Jornalistas Fluminenses” apoiado em a narrativa do próprio Coelho Netto, estampada numa crônica do “Jornal do Brasil”) dá esse episódio como ocorrido na noite de 13 de Maio.

Assim também Osvaldo Orico em seu delicioso volume sobre Patrocínio (pgs. 163 e 164 da 2ª. edição), fiado em Coelho Netto e Humberto de Campos.

Entretanto, Benjamin Constant, cujo Diário correspondente a 1888, pude consultar graças a gentileza de seu digno neto, Mário Serejo que no dia 13 se achava em Paqueta com família.

Eis suas próprias notas sobre a Lei Áurea:
“8 de Maio .
“Assisti, na Câmara dos Deputados, à leitura e aprovação do projeto de abolição incondicional e imediata apresentado pelo Governo. Esteve imponente a sessão.
“13 de Maio.
“A. Princesa Imperial Regente sancionou hoje a áurea Lei n0. 3.353, que declara extinta a escravidão no Brasil, o qual agora se pode felizmente considerar um país verdadeiramente livre. A alegria do povo tocou ao delírio. Parabéns à humanidade. —, Estava em Paquetá com a família, por isso não assisti. B: C. B. M.

l4 de Maio.

“Vim, com toda a família, para a corte afim de assistir às festas da libertação; Foi indescritível o entusiasmo popular. Fui com os alunos e professores do Instituto dos Cegos cumprimentar o Conselheiro João Alfredo, e, à Redação da Cidade do Rio, o seu principal José do Patrocínio, o incansável e vitorioso batalhador pela causa da abolição”.

(V. Benjamin Constant: “Carteira de Lembranças, 1888).

Acaba de tirar qualquer dúvida a esse respeito a “Cidade do Rio”, número de 15 de Maio de 1888, onde vem a noticia, da visita de Benjamin a Patrocínio.

O, mais curioso, porém é que esse numero da “Cidade do Rio’ de 15 de Maio de 1888, que é, ao lado do Diário de Benjamin, o documento mais fidedigno do episódio em apreço, ao noticiar a visita, efetuada na véspera, dá Patrocínio como ausente.

Eis o que diz:

“Às 71/2 da noite o ilustrado major doutor Benjamin Constant, seguido da banda de música do Instituto dos Meninos Cegos, veio ao nosso escritório cumprimentar a José do Patrocínio.

“O diretor do Instituto, em nome dos meninos, pronunciou um notável discurso pondo em relavo o grande mérito de Patrocínio e congratulando-se com a pátria pelo feliz acontecimento.

“Por não estar presente o redator chefe, o nosso colega Coelho Netto respondeu agradecendo”.
(“Cidade do Rio” de 15 de Maio de 1888, pg. 1ª. coluna: “Ao Nosso Chefe”, grifos deste transcrição).

Sera que, pelo ‘arroço” de Patrocínio, como lhe chama Mattoso Maia Forte, não quis o seu jornal dá-lo como presente, ou foi Coelho Netto quem, esquecido, romanceou a comovente cena transcrita no texto desta palestra?.

Investiguem e respondam os doutos, e, em primeiro lugar, o mais completo, desvelado e talentoso biografo de Patrocinio, Osvaldo Orico.

(4) A “Memória” de José Bonifácio sobre a Escravatura.

Há engano, da parte de Miguel Lemos e forçoso reconhecê-lo - quando diz “ter tido a honra de haver tirado do “completo esquecimento”, em que jazia, o monumental opúsculo de Jose Bonifácio sobre a escravatura’.
Esse engano tem sido, aliás, compartido por quase todos os positivistas brasileiros, e, entre outros, pelo erudito e conceituado mestre, Professor Pedro A. Pinto, em suas “Linhas Esquecidas”, pgs. 143 e 144 da edição de 1922.

Editada era Paris, em 1825, e, em Londres, traduzida para o inglês, em 1826, fora a “Memoria”, de José Bonifácio sobre a escravatura reimpressa, no Rio, em 1833 e 1840, e, no Ceará, em 1851.

A reimpressão de 1833, no Rio, foi feita na Tipografia de Brita e Companhia, e tem uma introdução em que se exalta a figura e a obra “deste Pai da Pátria e Patriarca da independência do Brasil”, defendendo-o contra os que o apelidam inimigo da igualdade, arrotando e incomodando-nos os fim cansados ouvidos com o seu falso e fingido republicanismo”.

E, depois de algumas considerações para evidenciar que o Patriarca não tinha preconceitos contra os homens de cor negra, assim termina a introdução:

‘José Bonifácio de Andrada e Silva, tu, que, ao lado do Príncipe, soubeste, cura teus sábios e políticos planos, empreender, executar e consolidar a Independência da tua e minha Pátria; tu, cujo nome é respeitado e celebrado na Europa culta, como sábio Brasileiro; tu, cujo nome os disfarçados inimigos de nossa feliz Independência jamais podem com satisfação e gosto repetir, estarás eternamente gravado com caracteres d’ouro nos corações dos verdadeiros amigos da Independência:

 Tu és o esmalte, e glória do Brasil; e que esses desgraçados e mesquinhos zoilos da tua glória te odeiem é a tua maior ventura!

“Recebe, imortal Andrada, os sinceros votos d’estima, veneração e respeito d’um jovem, que ama cordialmente a Independência de sua Pátria, e, por consequência, te venera e contempla como Autor dela”.

Infelizmente, por debaixo desta vibrante expansão, só se encontram, como assinatura, três pequenas cruzes reproduzindo-se, em seguida a Advertência da lª. edição, de Paris, 1825, assinada por Á. D. iniciais que, como se sabe, indicam o Conselheiro Antônio de Menezes Vasconcellos Drumond.

Em 1840, na Tipografia de J. E. S. Cabral, foi novamente reimpressa, no Rio, a Memória em apreço, trazendo, aumentada, a introdução da edição de 1833, ainda assinada por três pequenas cruzes.
Em 1851, no Ceará, saiu a 4ª. edição portuguesa da Memória de José Bonifácio, desta vez por iniciativa do Padre Alexandre Francisco Cerbelon Verdeixa, que a remeteu ao Presidente do Ceará para que este a fizesse distribuir a todas as câmaras municipais da Província, afim  dizia de “fazer circular as idéias tão sabiamente emitidas sobre a escravidão e sobre a derrubada das matas”.

Depois’ desta advertência, constituída pela própria carta que dirigira ao Presidente do Ceará, ofertando-lhe a edição, transcreve o  Padre Verdeixa encomiástico artigo sobre o Patriarca e sua atitude abolicionista publicado em o número 39 do jornal “Juiz do Povo” sob o titulo: “O Trafico Dos Africanos,: O “Filantropo”. Nossos Rios E Fontes’.

No belíssimo volume que o Ministério da Educação acaba de dar à publicidade: “Exposição José Bonifácio”, com pequena introdução do Diretor do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Dr. Rodrigo Mello Franco de Andrade, deixou; lamentavelmente, de ser incluída entre as obras de José Bonifácio na Biblioteca Nacional, a edição de 1833, que e a segunda edição portuguesá de sua “Memória, constante do Catálogo da referida Biblioteca, onde a compulsei.

E, quanto à edição do Ceará, há, no volume em apreço, o engano de dá-la como sendo de 1831 quando é de 1851, engano, aliás, em que já incorrerá Bellido em sua “Bibliografia Andradina”.

Em 1849, no tomo XII da “Revista do Instituto Histórico” (pgs. 176 e 177), cita o Cel. Inácio Accioli de Cerqueira e Silva longo trecho da Memória de José Bonitâcio sobre a escravatura.

E, nas páginas 228 a 245 desse mesmo tomo, transcreve ainda o Cel. Accioli, na íntegra, a Memoria do Patriarca sobre os índios, como apêndice de sua “Dissertação Histórica, Etno­gráfico E Política Sobre Quais Eram As Tribus Aborígenes Que Habitavam A Província da Baia, etc”.

Á Memória de José Boifácio sôbre a escravatura tornou a referir-se, entusiasticamente, transcrevendo-lhe trechos o Barão Homen de Mello em seu ‘Esbôço Biográfico De José Bonifacio”, estampado, em 1862, na popular coleção Biblioteca Brasileira”, dirigida por Quin­tino Bocayuva, onde saiu também a 1ª. edição das “Minas De Prata” de José de Alencar.

Depois dele, no 3º tomo de sua conceituadíssima  e citadíssima ‘A Escravidão No Brasil”, estampado em 1867, voltou a referir-se a essa ‘Memória” Perdigão Malheiro, transcrevendo mesmo, na íntegra, em apêndice, o projeto abolicionista aí apresentado pelo Patriarca.

No volume segundo (pg. 134) alude ainda o insigne historiador à “Memória” do Patriarca sobre os índios.
Sendo, a justo título, acatadíssimo, era o trabalho de Perdigão Malheiro muito conhecido dos abolicionistas — espécie de Vade-Mecum,  a que recorriam frequentemente.

Em 1º. de Janeiro de 1881, quando Miguel Lemos ainda se achava na Europa, “O Abolicionista”, órgão da “Sociedade Brasileira contra a escravidão”) publicou, sob o título: “O Velho ­José Bonifácio E A Abolição, o projeto do Patriarca, com o qual ocupou toda a 1ª. e parte da 2ª. página, fazendo-o preceder das seguintes palavras:

“O venerando patriarca da independência do Brasil publicou, em Paris, no ano de 1825, um opúsculo contendo a representação, que ele tinha de apresentar à Assembléia Constituinte, quando esta foi dissolvida.

“A representação concluía pelo seguinte projeto de lei, que é um patrimônio para o partido abolicionista orgulhoso de ver, a seu lado, o vulto de tão eminente patriota”.

Ferreira de Menezes, o devotado abolicionista, fundador da “Gazeta da Tarde”, fez, também, calorosa apreciação da memória de José Bonifácio sôbre a escravatura, na primeira página da “Gazeta da Tarde” de 8 de Janeiro de 1881, quando Miguel Lemos ainda não regressará ao Brasil, apreciação que Osório Duque Estrada transcreve nas páginas 277 e 278 de sua “A Abolição, sem lhe indicar a fonte.

Em 12 de Janeiro de 1881, com o título: “José Bonifácio E os Positivistas, publicou ainda a “Gazeta da Tarde” um artigo em que, protestando contra a atitude escravocrata de alguns positivistas de Itú e Jacarei, mostra que, já em 1825, José Bonifácio era abolicionista.

Reeditada, no Rio, em 1833 e 1840; no Ceará, em 1851, e mencionando-a, encomiasticamente, em 1849, na “Revista do Instituto Histórico”, o Cel. Accioli; em 1862, Homem de Mello; em 1867, Perdigão Malheiro; e, em em 1881, quando Miguel Lemos ainda se achava em Paris, ‘O Abolicionista”, além de Ferreira na “Gazeta da Tarde”, não se encontrava, em ‘completo olvido”, a “Memória” de José Bonifácío ao tomar conhecimento dela Miguel Lemos, focalizando-a, péla primeira vez, por escrito, em 1883. data em que se encontra a  primeira alusão à “Memoria” em aprêço nas  publicações do Apostolado Positivista do Brasil.

Mesmo admitindo-se que, a partir da instalação da sede da Igreja Positivista do  Brasil, efetuada em 11 de Julho de 1881, haja Miguel Lemos feito, oralmente, referências à Memória de José Bonifácio sôbre a escravatura, como deixa supor Teixeira Mendes na página 26 do seu “Resumo Cronológico da Evolução do Positivismo No Brasil”, é sempre incontestável que tal Memória não se achava, então, no completo olvido para os que conheciam a “Revista do Instituto Histórico”, os trabalhos de Homem de Mello e de Perdigão Malheiro, “O Abolicionista” e a “Gazela da Tarde”.

É digno de nota não fazer Teixeira Mendes a menor referência às Memórias de José Bo­nifácio nos seus ‘Apontamentos para a solução do problema social no Brasil”, publicados, em Outubro de 1880, na “Gazeta da Tarde”, assim como na forte apreciação de nosso envolver social, efetuada em 7 de Setembro de 1881, e publicada com o título de “Pátria Brasileira’.

Também Miguel Lemos não mencionou as referidas Memórias nem nos “Pequenos Ensaios Positivistas”, editados no Rio, em 1877, nem no discurso proferido, em 1881, na comemoração positivista do 7 de Setembro, nem, finalmente, na “imigração Chinesa”, estampada em 1881, onde, entretanto, se reporta à atitude abolicionista dos revolucionários de 1817.

João Pérnetta, no livro “Os Dois Apostolos”, vol. 1º. pg. 25, diz que na “A Ideia”, “A Crença”, “O Rebate” e a “Crônica Imperio”, Miguel Lemos e Teixeira Mendes abordaram a luz   dos novos princípios de sociologia, os múltiplos aspectos dos problemas nacionais, sobre tudo os mais prementes do abolicionismo e da república”.

Nada menos exato, porém, porquanto, nesses periódicos, Miguel Lemos e Teixeira Mendes tratam exclusivamente de matemática e assuntos de ensino, sem aludir sequer à abolição e à república: “desenvolviam, as vistas históricas de Augusto Comte e a sua filosofia das ciências”, diz o próprio Miguel Lemos na “Primeira Circular Anual” (pgs. 16 da ed. de 1900).

As preocupações de ordem propriamente social só começaram a manifestar-se nos escritos de ambos depois de haver Miguel Lemos sofrido, em Paris, a decisiva influência de Laffite, conforme a descreve em sua primeira.

“Circular Anual” (Vide a edição de 1900, pg.21 e nota de 1900).

Mostra bem o que fosse o estado do seu espírito, até então, a exasperadora “ Filosofia do Desespero”, que êle reproduziu, anotando-a, nos ‘Pequenos Ensaios Positivistas”.

Entretanto, o Barão Homem de Mello, que, em seus dois livros: “Esboço Biográfico De José Banifacio” (1862) e “A Constituinte Perante A História” (1863), se revelara zeloso e entusiasta reverenciador da atuação política do Patriarca, citando-lhe as “Memórias” sobre a escravatura e sobre os índios, lhe realçará a ação abolicionista no formoso discurso, que proferiu ao inaugurar-se, no Rio, em 1872), a estátua do grande patriota, erigida por iniciativa do Instituto Histórico.

É pois, fora de dúvida não jazerem no completo olvido”, as memórias de José Bonifácio sobre a escravidão e sobre os índios, quando a elas aludiu Miguel Lemos.

Si porém, não as tirou do esquecimento, se preocupou Miguel Lemos em realçar o relevantíssimo papel desempenhado por José Bonifácio na elaboração de nossa independência, transfonando-a, por assim dizer, num golpe de Estado do Príncipe Regente, como, aliás, já o frisara, em 1838, o Conselheiro Silva Maia em seu “Elogio Histórico do ilustre José Bonifácio”, editado, em avulso, nésse mesmo ano de 1838, e reproduzido no vol. VIII da “Revista do Instituto Histórico”.

Constituiu, pois, o papel de Miguel Lemos em contribuir para incentivar, secundado por Teixeira Mendes e péla corrente positivista brasileira, o trabalho de reabilitação do grande Patriarca, com o qual já se havia ocupado – manda a justiça que o repitamos – em 1862), Barão Homem de Mello, em seu interessante “Esboço Biográfico de José Bonifácio”, seguindo; dignamente, as pegadas do Conselheiro Silva Maia.

Compreende-se, destarte, não haja o General Rondon, no discurso com que se empossou: no cargo de Diretor de Serviço de Proteção aos Índios, feito nenhuma referência à ação de Miguel Lemos no atinente às duas mencionadas Memórias de José Bonifácio, o que deu lugar a um artigo do Fundador da Igreja Positivista do Brasil, publicado nos “A Pedidos” do “Jornal do Comercio” de 13 de Setembro de 1910 (Publicação n0. 305 do Apostolado Positivista do Brasil).

O próprio Teixeira Mendes, que, para escrever o seu “Esboço Biográfico de Benjamin Constant”, leu e muito apreciava a obra de Perdigão Malheiro, a que frequentemente recorre, deixou também de mencionar, apesar do artigo de Miguel Lemos em 1910, haver éste último tirado do “completo olvida” as memórias” do Patriarca quando, em 1917, na publicação (nº. 418): “A Igreja E O Apostolado Positivista do Brasil: Seu Passado, Seu Porvir, Seu Presente Na Hora Da Transformação De Miguel Lemos”, assinala sua própria ação e a de seu egrégio colega em quase 40 anos de apostolado.

É que para gloria de Miguel Lemos; basta, além de seus outros serviços - e eles foram grandes e numerosas     o haver concorrido para incrementar o culto de José Bonifácio, quase inexistente em seu tempo: “descurado pelas monarquistas e menosprezado pelos republicanos”, segundo suas próprias palavras.

(5) Nos pródromos da queda do Gabinete Cotegipe, figura, como frisa Teixeira Mendes, nova questão militar (V. a publicação da Igreja e Apostolado Positivista do Brasil nº. 8 de 1925).
É também o que faz ver Tobias Monteiro:

‘De tudo se aproveitavam os abolicionistas, e, por trás deles, os republicanos. Um dia, por engano, a policia prendeu um oficial de marinha reformado, cujo juízo não era muito seguro e que por isso mesmo não era muito distinguido. Foi quanto bastou para que a imprensa abolicionista provocasse uma violenta corrente de hostilidade contra a polícia. Os motins sucediam-se, sobretudo à noite, e oficiais de marinha dirigidos por Wandenkolk reuniram-se no Clube Naval para incitar marinheiros contra a policia.

*Referiu-nos um oficial de marinha que, ao cessarem os motins, a Princesa desceu de Petrópolis uma manhã e desembarcou no arsenal. Era hora de estarem ali reunidos muitos  ­oficiais, à espera de transporte para os navios.

Logo que viram aproximar-se a galeota, combinaram eles exprimir o seu descontentamento à Regente. Alguns chegaram ao ponto de fitá-la, sem levar a mão ao boné”.
(Tobias Monteiro: “Pesquisas E Depoimentos Para A História”, pgs. 172 e 173 da edição de 1913).

Osório Duque Estrada regista o nome do oficial, cuja prisão, por equívoco, motivara a questão militar á que aludem Teixeira Mendes e Tobias Monteiro — Leite Lobo é como se chamava.
(V. “A Abolição”, pg. 228).